sábado, 8 de junho de 2013

Eu e você, 2012 (dirigido por Bernardo Bertolucci)


O amor entre irmãos aparece, nas condições que estão colocadas, como uma impossibilidade que a ordem de apresentação das coisas parciais que o representam desmente aos poucos. Eles são filhos de mães diferentes e é este o centro de seus aspectos problemáticos mais evidentes. As mães diferentes e, no caso de Olívia, um ressentimento em relação ao pai, que a abandonou com sua mãe, para viver com Sonia, com quem teve outro filho, Lorenzo. Este pai não aparece em momento algum.

As consequências aparecem antes dos atos que as desencadearam. Isso, de forma não tão fragmentada. As coisas, na verdade, se explicam aos poucos. As palavras do psicólogo a Lorenzo na primeira vez em que ele aparece, indicam que ele seja um adolescente problemático, como também o fato em si de estar diante de um psicólogo. As palavras do psicólogo, não é possível saber, no entanto, num primeiro momento, a que especificamente se referem. O personagem de Lorenzo vai se caracterizando pela articulação desta primeira impressão com aspectos que se podem deduzir das atitudes que se seguem. Ele visita a loja de animais exóticos, compra coca-cola e bobagens para comer, tudo em número de sete unidades. Fica claro, conforme as coisas acontecem, que isso foi uma preparação para a execução de seu plano de passar alguns dias no porão da casa em vez de ir para a viagem com a escola. Lorenzo é organizado ao extremo. Essa organização soma-se à sua inclinação para o isolamento que, mais que isso, é um esconder-se da vida. É um narcisista, como dizem dele seus pais num sonho. Olívia diz que ele precisa parar de se esconder e começar a viver.

Já no porão, pouco tempo depois aparece Olívia, sua meia irmã, numa situação improvável e providencial para o desdobramento da trama. Neste momento ainda não se sabe que são irmãos. Lorenzo se esconde em meio às tralhas do porão, Olívia o encontra. Eles têm uma discussão meio impessoal, que não permite saber da existência de laços entre eles, até que Olívia diz algo como “o dinheiro que seu pai me deu” e, então “ele é seu pai também!” responde Lorenzo. “Mas sua mãe roubou minhas coisas”, e por dizer isso Olívia ganha um empurrão de Lorenzo, “não fala assim da minha mãe!” São meio irmãos. Olívia vai embora e Lorenzo sente o prazer de estar novamente sozinho, lendo o livro sobre o vampiro Lestat. Ele lê de cabeça para baixo, até que Olívia diz que vai acabar, desse jeito, acumulando sangue na cabeça.

Olívia volta no meio da noite e Lorenzo é obrigado a abrir para evitar que seus gritos revelem a presença dele no porão. Olívia era viciada em heroína e estava, neste momento, passando por uma crise de abstinência. Ao cuidar de Olívia Lorenzo desenvolve maturidade, uma possibilidade de saída de seu narcisismo. Os irmãos começam a se aproximar, mas o amor de irmãos continua improvável pela expectativa de que os sinais da forma como acontece essa aproximação entre meio irmãos confirmem a aparência de que o que está para acontecer é a atração sexual entre eles, ainda mais que conseguem álcool durante a noite e Olívia, mais velha, convence o irmão a beber também um pouco. Essas expectativas são alimentadas pelo fato das fragilidades afetivas aparentes de Lorenzo, pelos preconceitos desencadeados pela personalidade de Olívia, dada a drogas e às artes e pela ideia formada sobre as escolhas estéticas recorrentes de Bertolucci. Além disso, o primeiro diálogo de Lorenzo com a mãe indica uma disposição nesse sentido. Eles estavam num restaurante e Lorenzo diz “você acha que as pessoas podem pensar que somos um casal?” A mãe responde que é claro que não, que veriam que são mãe e filho. Lorenzo propõe à mãe uma hipótese sobre o que aconteceria se todas as pessoas do mundo morressem e sobrassem apenas os dois. A mãe fica desconcertada, e Lorenzo diz que seria uma questão de sobrevivência para a humanidade...

Mas a ligação sexual entre Olivia e Lorenzo não acontece. Olívia quer se libertar da heroína e Lorenzo descobre possibilidades de viver fora de seu isolamento. O apoio que encontram um no outro tem como conclusão o amor inesperado entre irmãos, para além dos ressentimentos gerados pelas divisões familiares e das tensões sexuais incestuosas que se insinuam.

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