quinta-feira, 4 de março de 2010

parágrafos

Pedaços do teto refletidos no chão enquanto tentava olhar dentro de si mesmo. Os restos da luz de um dia passado eram o contraponto à penumbra do quarto no presente. Sem mais sons, arremessa o espelho: cacos espalhados. Reflexos de um mundo não desejado. Resignação: abaixa a cabeça, pedaços do teto refletidos enquanto encara o vazio.

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Depois de acordar, costumava apreciar o movimento suave das folhas das poucas árvores observáveis a partir da janela do meu quarto. Era uma época agradável, hoje percebo. As árvores permaneceram. Eu perdi as raízes. Estou seco. Peço esmolas e tento amainar minha sede afogando-me em aguardente e lembranças roídas.

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A imagem da Santa foi encontrada no rio perto do qual vivi minha infância. Interpretei isso como demonstração inequívoca de bom agouro. Pedi para meus dois filhos reunirem toda a família para visitarem-me no hospital, minha residência permanente nos últimos três meses. Todos espremidos em minha morada: olhei serenamente para esse conjunto de existências. Ordenei, sem demonstrar raiva ou nervosismo, que me matassem. Não esperava respostas, nem consolações, petrifiquei-me com um sorriso sincero no rosto.

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