quarta-feira, 26 de maio de 2010

diálogo monólogo

M.F. estava tranqüilo com seus 27 anos de idade. Aos 23 anos pensava em mudar o mundo a partir da educação, foi professor por algum tempo. Aos 25 desistiu de mudanças e trabalhou mais um ano apenas por inércia. Há seis meses deliberadamente sem emprego, utilizando as economias guardadas com ajuda de ascetismo e descrença no consumo, sobrevive por aí, conversando entre paredes com objetos inanimados, animados, vez ou outra algum ser vivo, até mesmo da sua espécie, mesmo sem vontade.

[Casa pequena de periferia. Silêncio no interior. Alguns sons vindos da rua, principalmente buzinas distantes. M.F. sentado em um sofá. Em sua frente, outro sofá. Entre os sofás uma pequena mesa.]

[M.F.]: O dia amanheceu bonito hoje... Talvez poderíamos dar uma volta.

[...]: Clonazepam.

[M.F.]: Não. Melhor continuar sentado mais um tempo. Esperar anoitecer.

[...]: Chumbinho.

[M.F.]: Não espero mais. Nada.

[Alguns minutos de silêncio]

[M.F.]: Nada. Melhor continuar assim. Apenas conversar com minha respiração e deixar você por conta de sua sorte.

[...]: Pedra 90.

[M.F. levanta. Olha mais uma vez para o espelho do banheiro que estava no sofá em sua frente, despede-se. Dois passos depois tropeça no sono e cai na morte.]


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