quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Tambor girava, girava, vazava os seis buracos com minha vista e observava um alvo longínquo e distinguível como um colega de ginásio transformado em fauno e acorrentado à vigas que se erguiam aos céus. Um piscar de olhos e, tambor fechado, estava novamente só, sentado numa cadeira em um quarto escurecido, com alguns relances de uma única luz que provinha de algum canto impossível de reconhecer, todavia próximo. Procurei, desorientado, pela maçaneta, pela porta, pela saída, por minutos, talvez horas. Corri pela rua vazia, nu e com o 38 firme na mão do braço direito estirado e teso apontado para frente, a espera de qualquer coisa na qual descarregar a mim mesmo na forma de seis projéteis justos: vi seis testas perfuradas e, com um sorriso triunfante e matreiro, pensei como poderia eu ser tão preciso na arte de desfazer os outros de suas tralhas que consideram vida.
Acordei, acendi a luz, esfrequei os olhos para ajudar no esquecimento do último sonho e olhei para os objetos dispostos na mesa. Abri o tambor, com paciência e felicidade sincera carreguei-o por completo. Encarei com o olho esquerdo o fundo do cano e não vi coisa alguma, ou antes, pressenti algo sem poder ver, os pêlos do braço eriçaram, uma ereção incontida manifestou-se, abri a boca e decidi-me por engolir uma bala e cuspi-la pelo crânio em um ângulo de 47º (em relação à parede), atirando para longe cérebro, sangue e ossos do chão asséptico da minha consciência.
Mais uma vez toca o despertador e mais uma vez desligo-o para mais uma vez cochilar e mais uma vez esquecer a potencialidade de morte do não-vivido.

Nenhum comentário:

Postar um comentário