quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Variação: Dexter

Eles estavam ali: sentados e observando. No céu a lua cheia brilhava, bela, agraciando-os nessa longa noite. Longa. Mas eles tinham paciência. Apreciavam cada minuto em silêncio.

Alguns metros dali estava ele: sentado e observando. Assistia os últimos minutos do jornal no conforto de seu sofá, dentro de sua aconchegante casa. Quando acabou o programa, desligou a TV e foi para seu quarto.

Eles inspiraram com satisfação. As mãos apertadas no volante. A qualquer minuto agora. Faltava pouco, pouco. A noite seria longa, só mais alguns minutos. Precisavam se assegurar que ele já estaria dormindo quando entrassem. Era assim que a caçada funcionava, embora, com certeza, fosse mais divertido quando a caça tinha ciência do seu predador. E eles iriam assegurar que ela soubesse, mas no momento certo. Por enquanto aguardavam. A qualquer momento. Uma hora , uma eternidade, mas o agora chegou, finalmente, e eles desceram do carro.

Caminharam até a porta pelas sombras. Se asseguraram que não havia olhos indesejados e em segundos arrombaram a porta. Estavam experientes nisso já, tão rápidos e eficientes como se tivessem a chave. Moveram-se silenciosamente. Estava escuro, mas não se importaram. Os sentidos estavam no auge. Tudo parecia tão claro. E já estiveram ali, claro, conheciam muito bem a casa. E se moveram rapidamente até o quarto. Deram uma espiada lá dentro. Dormia. Muito bom. Foram ao banheiro primeiro, não porque precisavam usá-lo, mas para deixar uma pequena linda supresa. E retornaram ao quarto, desta vez para ficar.

Observaram a caça e uma estimulante sensação percorreu cada músculo de seus corpos. Eles suspiraram em prazer. Logo ele seria deles. Inspiraram. Logo. Expiraram. Ele tinha uma poltrona logo ao lado da cama. O lugar perfeito para se sentar e observar. Admiravam sua caça, enquanto aguardavam. Não havia graça em eliminá-la assim, inconsciente, sem saber porque e por quem. A qualquer minuto. Cada segundo a fome aumentava. Eles resistiam, sabiam que isso só aumentaria a satisfação. E aconteceu.

Do banheiro uma música começou a soar. Ele acordou assustado. Conhecia aquela música, eles sabiam, e observavam. Ele correu até o banheiro, sem perceber que não estava sozinho no quarto e ali estava ele, dentro da pia, soando. Ele conhecia aquele celular, mas o que fazia ali? Caminhou trêmulo e o pegou. Na tela havia uma mensagem: "Bu!". Eles sabiam que não era muito criativo, mas fazia o serviço, e antes que ele pudesse reagir, um cabo estava em torno do seu pescoço. Tão forte que ele não conseguia respirar.

- É inútil resistir contra nós. - E logo ele estava inconsciente de novo.

A lua, bela, bela, bela lua. No seu auge, tão perfeita, tão cheia, dominando o céu. Assim como eles dominavam o homem na terra. Tão bela lua, os agraciando em seus movimentos. E finalmente o homem acordou. Confuso. Olhou em volta, estava sozinho naquele bosque. Como fora parar ali? Estava na sua casa e... Medo começou a lhe encher a alma. Olhou em volta, conhecia aquele lugar, era familiar. Seus sentidos alerta, se levantou e de novo o cabo estava em torno do seu pescoço. Forte, como da última vez. Sentiu uma pancada nas suas costas e caiu de joelhos. O cabo afrouxou um pouco e conseguiu respirar.

- Reconhece esse lugar? - Eles disseram, saboreando cada palavra.
- Eu, eu... quem é vo... - antes que pudesse terminar a frase sentiu o cabo apertar contra seu pescoço. Não podia respirar.
- Nós sabemos o que você fez. De novo e de novo e de novo. Mas nunca mais. - e eles aliviaram o cabo um pouco, o suficiente para deixá-lo respirar. Eles estavam em controle. E eles garantiram que ele soubesse disso.
- Argh.. Não sei do que estã... - E novamente ficou sem poder respirar. Eles se deliciavam com aquela sensação.
- Nós sabemos. E você sabe também. - Eles respiraram, o ar nunca parecia tão fresco como nesses momentos - vamos começar?

Eles entraram no carro. Estava feito e era hora de se despedirem. Deixou o demônio desvanecer-se nas trevas de sua alma. Ligou o carro. Sacrificou seu poderes para ser humano novamente, por um tempo. Acelerou. Por um tempo apenas, pois eles se veriam de novo e de novo, num ciclo sem fim.

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